quarta-feira, 30 de março de 2011

Ser e não ser

Pensei em fazer algo para não me repetir. Dia chuvoso, céu escuro, clima de serra gaúcha. Abri a janela do quarto e pude sentir aquele vento frio tocando minha pele. Não era inverno ainda, mas bem que podia ser. Por entre as portas do guarda-roupas fizgava com o olhar aquilo que iria me aquecer durante o dia. Difícil, ou melhor, cruel decisão a de escolher a roupa que se vai vestir, ainda mais para uma mulher.

O tempo gelado lembrava cores neutras. Imaginava um morron escuro ou preto, básico. Não foi o que acabei decidindo no final. E a pior decisão na verdade não se concentrava bem no vestuário. Qual seria o humor do dia? Estaria de cara fechada ou alegre? Já sei. Vai dizer que por que escolhi cores mais vivas o dia também vai ser mais feliz? Bobagem.

Os tons mesclavam entre rosa e azul. Azul da calça jeans, básica. E o que o rosa influenciaria no meu dia? Era só tropeçar no primeiro degrau do ônibus que meu dia inteiro teria ido para o lixo.

Nunca liguei muito para essas coisas de cores influenciarem ou não nossa motivação. Depois de certo tempo me dei conta de que inúmeras vezes nos deixamos levar por outras coisas bem menos perceptíveis.

Coisas? Que coisas? Aquelas que fizemos todos os dias quando acordamos. Aquele abrir de janela pronto para receber qualquer vibração e transformá-la na melhor possível. Aquele jesto simples frente a problemas enormes. Aquela atitude, sabe? Aquela que na maior parte das vezes ignoramos? Aquela de olhar o mundo com nossos olhos e de respeitar nossas próprias capacidades e as dos outros.

Nós escolhemos nosso dia. Nós escolhemos ser, ou não ser.

terça-feira, 22 de março de 2011

Certo olhar

Estava cansada. Não tinha como ir para casa. Resolvi ler um livro, promessa antiga que fiz a mim mesma e ainda não cumpri. Não aguentava segurar meus olhos abertos. Era um peso incrível. Minha pálpebra abria e fechava lentamente. Tudo que me preocupava naquele momento eram os outros. Tinha medo de que pudessem estar me vendo, me assistindo como se eu fosse a atração principal daquele palco.

Descobri que não estava só naquela pequena sala que compunha o todo. Um barulho chamou minha atenção. Asas debatendo e lá estava o pequeno inseto. Uma joaninha, igual aquelas que constumamos ver em livros infantis. A cor vermelha encantava junto às pontinhas pretas. Na verdade, o tamanho nunca condiz com o esperado. Não imagine algo grande. Parecia uma bolinha, minúscula. Linda!

Pensei em ajudá-la, já que o livro não prendia minha atenção e o sono estava me devorando. Passei um tempo virando e revirando aquela beldadezinha, mas não adiantava, ela parecia não gostar do que eu fazia e muito menos querer minha ajuda.

Resolvi não me mexer. Parei e comecei a observá-la. Entendi que minha intenção estava dificultando o seu plano, visto que não tinha compreendido o seu desejo. Entendi que as vezes acreditamos ser mais capazes do que os outros, mas nem sempre isso é fato. Muitas vezes ignoramos o pedido ao invés de oferecer a mão e quando oferecemos algo, geralmente a intenção não é a melhor.

Naquele dia, porém, a ideia era boa. Realmente queria ajudar. Ela, porém, me fez ver que compreender primeiro é melhor do que despender esforço ao léu.   

terça-feira, 8 de março de 2011

Homenagem às mulheres

Dia 08 de março.
Acordar cedinho e pensar:
Hoje é o Dia Internacional da Mulher, é o meu dia.
E o que muda em minha vida?
Talvez agora nada mais mude,
mas quem sabe como estaria sendo este presente se não fosse a história de luta de personagens tão importantes.

Não há diferença alguma entre raças, cores e gêneros.  
Mulheres representavam o sexo frágil.
Hoje dão um baile de competência.
São donas de casa, empresárias, estudantes, mães, cidadãos.

Azul, vermelho, rosa, amarelo, não importa.
Temos um dia nosso,
para representar todas as nossas conquistas, todas as dificuldades enfrentadas e todo o merecimento que está por vir.
Mas, no fundo, a verdade é uma só.
Não existe o dia da mulher.
Todos são os nossos dias.   

Feliz Dia da Mulher!

segunda-feira, 7 de março de 2011

Um dia de saudade

   Não sabia dizer exatamente o que sentia. A mesa estava repleta de trabalho. Muitos livros me esperavam. Tinha saudade daquele tempo de menino, em que uma única ideia enchia minha cabeça: jogar bola. Que garoto não sonha com isso? Aposto que a maioria.

   Ao longo do tempo meu sonho tinha se tornado outro. A sala em que escrevo era um de meus desejos. Um lugar só para mim. É silenciosa, cinza, como deve ser uma sala de trabalho, ao menos era assim que eu sempre a imaginava. Nos dias de chuva, podia ouvir o barulho do vento e os pingos batendo com força contra as vidraças.

   Meu filho também queria ser jogador de futebol. Nunca lhe dei uma bola, desejo devasso que poderia suicidar uma boa parte de sua vida. Minha mulher me culpa até hoje por isso. Mas eu sabia que ele não seria. Ele não tinha jeito, sabe, não tinha estilo para aquilo. Ele tinha cara mesmo era de empresário, ou médico.

   Ele se foi. Ele e a minha mulher também. Nunca acreditei nos seus desejos. Nunca incentivei seus sonhos. Sofri tanto com minhas imaginações que só queria evitar o pior para eles. Mas ela não entendia. Não entendia o porquê daquele ser tão egoísta, tão dono de si, tão controlador.

   Sinto falta deles. Jamais pensei que diria isso, mas sinto. Sinto uma dor forte aqui dentro toda vez que deles me recordo. Penso que poderia ter sido diferente. Hoje ela trabalha em turno integral. Ele está estudando sei lá o quê. Nunca mais vieram me visitar. Nem cartas, e-mails, nada. Eu também nunca fui.

   Permaneço na solidão. Espero o dia de sentir falta de, de sentir saudade de. Paro por um tempo, não mais do que cinco minutos. Paro para pensar em tudo que podia ter sido feito. Uso sempre a mesma forma verbal, aquela que une o passado ao futuro. Sinto que estou cada vez mais perto do abismo que via em meus sonhos e que a morte do tempo que tentei com tanto esforço evitar em meu filho agora me atinge em cheio.

   Um dia de saudade.